quarta-feira, 14 de abril de 2010

Qual esquecimento não é doloroso?

Caros críticos. Certa vez, no quartel passei por uma situação que conseguiu cravar uma lança de “peso emocional” em minha alma. Não estava em guerra, muito menos em alguma situação extrema de sobrevivência, estava apenas no que todos ouvem sobre o tempo do obrigatório de quartel.
Estava em serviço e uma situação conseguiu fazer com que refletisse sobre o homem e a existência que o rodeia.
Um homem, pra bem dizer um velho, apareceu naquele sábado ensolarado e quente. Estava na situação de cancela do portão, algo como se fosse o controlador do que chega e sai do batalhão de onde servia. Aquele ser senil chamou-me a atenção pelo seu estado de abandono e descrédito, praticamente um mendigo. Mas, tinha um papel em suas, calejadas e cheias de rugas, mãos que desafiavam meu preconceito de gente decente que visitava o quartel.
Não me conti e perguntei com certa arrogância e violência, que só a juventude e a confiança de um militar poderia conceber, por que ele estava na frente daquela fortaleza contemporânea. Ele queria saber sobre a homenagem que iria acontecer referente aos praças que serviram à quarenta ou cinqüenta anos atrás no Batalhão de Policia do Exercito.
Eu era treinado para rolar e atirar, conter avanços e sobre saltos, mas nunca situações como aquelas que requisitavam uma frieza sobre-humana. Não sabia como falar ao homem que a homenagem havia acontecido à alguns dias atrás e provavelmente não teria outra, se não nos próximos cinqüenta anos.
Quando olhei os olhos daquele homem na minha frente desabei em desalento no meu interior. Olhos que esperavam por uma boa notícia que não fosse uma resposta negativa ou "que foi um engano". O silêncio foi abrupto e tornou-se tão grande e frio quanto a cancela entre eu e ele.

Olhei para o chão, pois não conseguia encara-lo e informei que já havia acontecido fazia alguns dias. O homem abriu a boca como se fosse cair sem ar, mas eu repetia que foi uma grande "judiaria", porém ele não me ouviu... De certo, já havia escutado tantas coisas ruins que esta era só mais uma que se acrescentara no seu currículo de infelicidades.
Ele virou, disse um obrigado gélido como uma lâmina samurai e sumiu na rua daquele morro, onde ficava o quartel. Fiquei paralisado olhando as pegadas do chinelo do homem na areia que logo sumiriam, tal como a lembrança de tempos antigos que aquele homem pensou em reviver.

Lembro-me que aquela situação me afetara, pois havia participado da formatura de homenagem, no qual conservava uma beleza nostalgica que jamais contemplei. Não era o único entre os recrutas e superiores que chorararam ou tinha os olhos em lágrimas. Estou longe de ser um apaixonado pela nosso pátria amada, assim como muitos contemporâneos, contanto a realidade era que todos se sentiam tocados pela cena de vários homens de bastante idade marchando com toda sua energia que conseguiam dar naquele momento.

Não chorei ao ver o homem esquecido indo embora, mas aquilo foi algo que gostaria jamais viver, mesmo que estejamos fadados à isso. O esquecimento.

Dionysius Mattos